Laryssa Borges
Direto de Brasília
Aos 12 anos de idade e no interior do Mato Grosso, ele não percebeu que aquele 13 de dezembro de 1968 marcaria a história do país. Não viu movimentos estudantis contra o ato institucional assinado pelo presidente Arthur da Costa e Silva e não teve pessoas próximas como vítimas da tortura do regime militar. Hoje, 40 anos depois, Gilmar Mendes, presidente da mais alta corte do País, o Supremo Tribunal Federal (STF), afirma que o Poder Judiciário "sofreu" com o AI-5 e de maneira alguma pode ser acusado de ser complacente com a onda de cassações de parlamentares eleitos pelo povo promovida após a confirmação do pior momento da ditadura.
Nos anos mais rígidos do regime coordenado pelos militares, o então ministro Aliomar Baleeiro foi o relator de um habeas-corpus em que decidiu submeter à Câmara dos Deputados o pedido de licença do governo para cassar, mesmo que sem denúncias ou condenação, o mandato do deputado federal Márcio Moreira Alves (MDB). Moreira Alves foi o porta-voz de um discurso inflamado na Casa, em que criticava os militares e pedia que as mulheres não se sujeitassem a acompanhar cadetes em um baile da Marinha naquele ano.
"É um período extremamente delicado da nossa história, consagra poderes ditatoriais nas mãos do presidente, daí as cassações de mandato. Todos nós que vivenciamos conscientemente esse período sabemos da força que isso significava e da força excepcional autoritária que isso dava ao poder central", disse em entrevista ao Terra o ministro Gilmar Mendes. "(O STF) foi vítima. O Tribunal foi fortemente atingido e ainda hoje certamente guarda marcas desse período", avalia.
As "marcas", segundo Mendes, refletem a postura do STF diante da crise institucional resultado do AI-5 e evidenciam "o que fizemos e o que deixamos de fazer com toda sinceridade e abertura". Durante os anos de ditadura, por meio do Ato Institucional nº 2, cinco novos ministros foram nomeados para o Supremo a fim de facilitar e ratificar no Judiciário as ações do governo militar, entre eles Aliomar Baleeiro, relator do caso Márcio Moreira Alves. Pouco mais de três anos depois, com o AI-5, eram cassados no mesmo STF os ministros Victor Nunes Leal, Evandro Lins e Silva e Hermes Lima.
"O próprio Supremo Tribunal Federal sofreu com isso, com (os ministros) Victor Nunes (Leal), Hermes Lima e Evandro Lins e Silva, que foram atingidos pela cassação", comenta o presidente da Suprema Corte. Sobre o caso Baleeiro e a eventual "anuência" do tribunal diante do AI-5, Mendes é cauteloso: "é claro que (o caso Moreira Alves) era um processo peculiar, mas era um processo regular. A partir daí, claro que o momento político levou a essa deflagração (da ditadura), mas não podemos garantir que se não fosse neste momento não seria em outro".
"Nós tivemos depois outras crises", relembra. Em 1977, após a recusa do MDB, partido oposicionista, em votar um projeto de reforma do Judiciário proposto pelo governo, o então presidente Ernesto Geisel retomou instrumentos do autoritarismo e fez a vontade dos militares: fechou o Congresso, impôs o projeto à força e determinou a existência de eleições indiretas para governo e a nomeação de senadores biônicos.
"Essa (crise) eu acompanhei de forma bastante consciente. O governo Geisel tentou aprovar a reforma do Judiciário, e essa reforma não foi aprovada, o que resultou no fechamento do Congresso e na aprovação inclusive de emendas excepcionais com base no AI-5. Claro que era um poder verdadeiramente ditatorial", comenta Gilmar Mendes. "Felizmente conseguimos revogar o AI-5 e voltar à democratização", diz.
Redação Terra
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